Registros de 2023 são quase o dobro dos de 2022; Guarulhos precisou ser fechado por meia hora no ano passado.
SÃO PAULO
Pousos e decolagens tiveram de ser suspensos por cerca de 30 minutos na noite do último 21 de novembro em Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, porque quatro drones sobrevoavam ao mesmo tempo as proximidades do maior aeroporto do país.
Esse transtorno a passageiros e companhias aéreas, adotado como medida de segurança, passou a ser mais frequente. Segundo o Decea (Departamento de Controle do Espaço Aéreo), no ano passado foram reportados 59 casos de drones próximos de aeródromos, áreas destinadas a pousos, decolagens e movimentação de aeronaves —os aeroportos são aeródromos públicos.
O número é quase o dobro —84%– que o registrado durante 2022, quando 32 ocorrências acabaram reportadas ao órgão militar.
Os avisos são feitos por pilotos de aviões, agentes de aeroportos e operadores de voo, entre outros.
Avião pousa no aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo; drones são ameaça durante aproximação de aeronaves da pista – Karime Xavier – 22.12.22/FFolhapress.
Uma regulamentação proíbe drones e outras aeronaves não tripuladas de voarem no espaço aéreo próximo de aeródromos —para isso é preciso de uma autorização especial da FAB (Força Aérea Brasileira).De acordo com instrução do Comando da Aeronáutica, para voos de até 131 pés (aproximadamente 40 metros), a operação de drones deve ocorrer a ao menos três milhas náuticas de distância do aeródromo (cerca de 5,4 km).Voos entre 131 e 400 pés (40 a 120 metros) não podem ocorrer a menos de 5 milhas náuticas de distância (cerca de 9 km).
Restrição para áreas próximas a aeroportos e heliportos
• Para voos de até 131 pés (cerca de 40 m), a operação deve ocorrer a 3 milhas náuticas de distância do aeródromo (cerca de 5,4 km)
• Para voos entre 131 e 400 pés (40 a 120 m), a operação deve ocorrer a 5 milhas náuticas de distância do aeródromo (cerca de 9 km)
• Operações próximas a aeródromos podem ser solicitadas pelo sistema Sarpas, mas dependem da emissão de informe à comunidade aeronáutica (Notam)
• Voos que não respeitem os limites de distância poderão ser realizados em circunstâncias especiais, desde que autorizados pelo Decea (Departamento de Controle do Espaço Aéreo)
• Operações não autorizadas nas proximidades de aeroportos são consideradas “ato de interferência ilícita contra a aviação civil”
• Expor a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea pode ter como pena reclusão de 2 a 5 anosFontes: Força Aérea Brasileira e Vitor Barbosa, presidente da Comissão Especial de Direito Aeronáutico da OAB/SP.
A preocupação com o crescimento do problema fez o Decea emitir um alerta para pilotos terem cuidados especiais durante as festas de fim de ano, período considerado propício para fotos, inclusive com drones.
Gerente de navegação aérea do aeroporto em Guarulhos, Marilisa Mira Ramos afirma que o choque entre um drone e um avião pode provocar uma tragédia.”Há o risco de acontecer o pior, como a queda, porque ele [drone] pode ser sugado pela turbina e provocar uma pane. Ele também pode bater no para-brisa [e quebrar] da aeronave”, diz.
Para Cyro Albuquerque, professor de engenharia mecânica da FEI (Fundação Educacional Inaciana), é difícil mensurar o impacto, já que ele depende de fatores como velocidade e estrutura da aeronave, local da colisão, massa e configuração do drone.
“Mas, em um avião de pequeno porte, provavelmente a colisão resultará em um acidente sério”, diz o engenheiro.
“Aviões de maior porte podem resistir ao choque de pequenos objetos, dependendo do local da colisão, que pode ser séria se ocorrer em locais como o motor, superfícies de controle ou tanques de combustível, ou ainda causar descompressão da cabine se atingir a fuselagem.
“O fechamento do espaço aéreo em novembro não é inédito em Cumbica. A GRU Airport, concessionária que administra o aeroporto, acionou seis vezes em 2023 os protocolos de segurança para casos de drones.
Os procedimentos incluem desde varredura no entorno até chamar a polícia.Em Congonhas, na zona sul de São Paulo, nenhum avião teve pouso autorizado das 13h15 às 13h31 do último dia 10 de novembro, pelo mesmo problema — em fevereiro de 2022, todas as operações já haviam sido suspensas por cerca de 1h20.No dia 30 de novembro passado, um piloto da Azul chamou a torre de controle de Viracopos para avisar que havia passado por cima de um drone quando fazia a aproximação.
A informação, que surpreendeu o controlador de voo, foi mostrada ao vivo pelo canal Golf Oscar Romeo, que têm câmeras para registrar pousos e decolagens em tempo real no aeroporto de Campinas.
Henrique Hacklaender, piloto de aviação comercial e presidente do SNA (Sindicato Nacional dos Aeronautas), alerta que a presença de drones ocorre nos momentos mais críticos de uma operação de voo, em áreas de aproximação para pouso “perto do chão” ou na decolagem “quando o avião está cheio de combustível”.”O fechamento de um aeroporto não é exagero, porque, além da segurança, é uma forma de se mandar um recado para as pessoas se conscientizarem do perigo”, diz.A localização das aeronaves não tripuladas costuma depender apenas do visual, já que o drone em geral não tem transponder, instrumento que permite a identificação em radares.Guarulhos e outros aeroportos chegaram a testar uma tecnologia que alertava sobre a presença de drones, mas ela não está mais em uso. Questionada sobre a descontinuidade do dispositivo, a concessionária que faz a gestão do aeroporto de Guarulhos não respondeu.
Regras
• Aeromodelos e RPA (aeronaves remotamente pilotadas) só podem ser operados em áreas com no mínimo 30 m horizontais de distância das pessoas não anuentes ou não envolvidas com a operação
• Cada piloto remoto só poderá operar um equipamento por vez
• Modelos com peso máximo de decolagem (incluindo o peso do equipamento, da bateria e de eventual carga) de até 250 gramas não precisam ser cadastrados junto à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), mas é preciso pedir autorização ao Decea (Departamento de Controle do Espaço Aéreo) pelo Sarpas (Solicitação de Acesso ao Espaço Aéreo Brasileiro por Aeronaves Não Tripuladas) no site https://servicos.decea.mil.br/sarpas/
• Aqueles que ultrapassem esses limites devem ser cadastrados e, se operado além da linha de visada visual ou acima de 400 pés (120 m) do nível do solo, o piloto deverá possuir licença e habilitação
• Segundo o Decea, as solicitações de voo serão analisadas mediante critérios técnicos e operacionais, tais como: tipo de operação, perfil de voo, classificação do aeródromo ou heliponto, condicionantes operacionais, espaços aéreos condicionados, acordos operacionais, termos de coordenação, entre outros
• Drones precisam ser registrados na Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), por operarem em radiofrequência
Fontes: Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), Decea (Departamento de Controle do Espaço Aéreo) e Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
A ABR (Aeroportos Brasil), associação que representa 59 aeroportos sob concessão, diz, sem especificar quais, que todos adotam procedimentos definidos pelos órgãos reguladores da aviação para que, mesmo com uma natural expansão do uso de drones, os aeródromos permaneçam seguros.
A Aeroportos Brasil, que administra Viracopos, avalia algumas opções de dispositivos tecnológicos para detectar drones, mas, por enquanto, além de olhares atentos, tem câmeras instaladas nas cabeceiras da pista.Sobre esses mecanismos, o Decea diz estar desenvolvendo uma solução antidrones para que operadores possam se basear ao adquirirem sistemas.Conforme a Aeronáutica, em 2023 fora solicitados aproximadamente 346 mil voos de drones no país.
CAMPANHAS
A popularização dos drones —com pouco mais de R$ 100 compra-se um aparelho pela internet ou em lojas de eletrônicos— dificulta a fiscalização, diz o presidente do Sindicato dos Aeronautas.
“Os usuários precisam entender que drones são uma aeronave e por isso, são normatizados por regras que devem ser cumpridas”, afirma a gerente da torre de Guarulhos, Marilisa Ramos.
O advogado Vitor Barbosa, presidente da Comissão Especial de Direito Aeronáutico da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo), afirma que a legislação prevê até cinco anos de prisão para “quem expor a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea”.
Especialistas ouvidos pela reportagem defendem a necessidade de constantes campanhas de conscientização em bairros próximos de aeroportos sobre os riscos de se operar drones nas imediações.
Em Guarulhos, o trabalho foi levado para cinco escolas.
“Fazemos campanhas de conscientização não apenas do uso inseguro dos drones, mas também para os riscos de se soltar balões e pipas”, afirma Fábio Carvalho, CEO da ABR.
Comunicação/MCZ/Sineaa/2024.